A natureza, todas as plantas, árvores, animais, fungos, elementos, minerais estão continuamente em transformação, em busca e movimento no sentido do equilíbrio e homeostase do Planeta Terra. Cada reino, de sua forma, contribui para a criação e manutenção da vida e toda sua diversidade.
Não diferente, a humanidade, vive impulsionada por um desejo primordial da existência: servir à vida, evoluir, atingir à realização plena como indivíduo e como coletivo. Conscientes ou inconscientes, buscamos diariamente, momento após momento, algo que realize e contemple a noção de realização, de sentido da vida. Algumas vezes, quando inconscientes, agimos por impulso através de registros que já estão impressos em nossos corpos, repetindo mecanismos já conhecidos, e as vezes (em maior ou menor proporção), tóxicos e destrutivos para nós mesmos e para as nossas relações.
Assim como tudo na natureza tem seu tempo de existir, nós humanos, em nossas diversas formas de ser e atuar no mundo, e com a capacidade cognitiva pertencente à nossa espécie, podemos existir e nos movimentar em consonância ou discordância da própria natureza, o que nos leva à lugares internos (e as vezes externos também) de equilíbrio ou desordem, felicidade ou sofrimento.
A existência e fortalecimento de um sistema sociocultural e religioso, como o capitalismo e o patriarcado, nos ditou e ainda dita, ideias sobre o certo e o errado, que tem nos afastado imensamente da própria natureza e realidade das coisas, simplesmente como elas são, sem a carga ideológico ou conceitual que atribuímos a elas.
Somos natureza, e assim como ela, temos dentro de nós a necessidade e capacidade de aprender, trabalhar e gerar equilíbrio para nós mesmos, e dessa forma, contribuir para o equilíbrio do todo.
No livro “A Vida Secreta das Árvores”, o autor Peter Wohlleben, discorre sobre a capacidade de aprendizagem e recuperação das árvores, que ele chama de A Escola das Árvores. Queremos fazer um paralelo aqui, convidando o leitor a ‘ser árvore’ durante essa leitura, enquanto se percebe em corpo vivo, que sente e respira.
Ele diz:
“Para as árvores, é mais difícil suportar a sede do que a fome, pois alimento elas obtêm a qualquer momento realizando a fotossíntese. No entanto, as árvores, não produzem alimento sem umidade. Por dia, uma faia adulta consegue captar mais de 500 litros de água nos galhos e nas folhas, desde que consiga extraí-las do subsolo.
No entanto, a umidade do solo se esgotaria rapidamente caso as árvores fizessem isso em todos os dias do verão europeu. Nessa época, não chove o bastante para encharcar o solo ressecado. Por isso, a árvore armazena água durante o inverno, estação em que chove mais do que o suficiente na Europa Central e a árvore praticamente não consome água, pois quase todas as plantas param de crescer nessa época.
Junto com as precipitações da primavera, que ficam armazenadas no subterrâneo a umidade captada é suficiente até o início do verão. Mas em muitos anos há estiagem. Com duas semanas de calor intenso e tempo seco, a maioria das florestas começa a passar dificuldade, o que afeta sobretudo árvores adaptadas a solos especialmente úmidos. Elas esbanjam água, e em geral são os espécimes maiores e mais robustos que pagam por esse comportamento.
Na nossa reserva, os abetos são os que mais sofrem – não em toda a sua estrutura, mas sobretudo no tronco. Quando o solo está seco e as agulhas da copa exigem mais água, a tensão na madeira ressecada fica alta demais. Ela estala e crepita até surgir uma fissura de quase 1 metro de comprimento que vai da casca até os tecidos mais profundos e fere a árvore gravemente. Em pouco tempo, esporos de fungos penetram a ferida, alcançam a parte mais interna da árvore e começam a causar destruição. O abeto tenta reparar o ferimento ao longo dos anos seguintes, mas ele se abre outra vez. Mesmo de longe é possível ver os sulcos pretos de resina endurecida, que marcam o doloroso processo.
Com isso, chegamos ao centro da escola das árvores, lugar em que impera a violência, pois a natureza é uma professora rígida. Quem não for atento e não se adaptar vai sofrer as consequências. Fissuras na madeira, na casca, no câmbio (camada cilíndrica de células extremamente sensível encoberta pela casca e que se estende em volta do alburno, a parte do tronco que conduz a água): a situação da árvore a grave. Ela precisa reagir, e não só tentando fechar os ferimentos. Depois que passa por isso, a árvore para de desperdiçar água e a distribui com mais eficiência. Ela de fato aprende esse comportamento e, por precaução, o exibe mesmo quando o solo está bem e úmido.
Na nossa reserva esse comportamento é comum entre os abetos que crescem num solo bastante úmido: são mimados com tamanho facilidade. Mas um quilômetro adiante, numa encosta seca e pedregosa, a situação é bem diferente. Quando cheguei ali pela primeira vez, esperava encontrar árvores afetadas pela forte seca do verão. No entanto, o que vi foi o contrário: ali as árvores eram disciplinadas e suportavam condições muito piores que suas colegas acostumadas à maior oferta de água. Mesmo com pouco água à sua disposição durante o ano (o solo armazena menos água e o sol queima multo mais, causando a evaporação), os abetos estavam saudáveis. Cresciam nitidamente mais devagar do que as de solo úmido, mas usavam melhor a pouca água a que tinham acesso e sobreviviam bem até em anos mais extremos.
É muito fácil ver como as árvores aprendem a lição da estabilidade. Basicamente elas evitam tudo o que é desnecessário.
(...)
Existe outra pesquisa com água que investiga mudanças de comportamento, mas traz uma nova informação: quando as árvores sentem muita sede, começam a gritar. Não podemos ouvir os gritos, pois eles se são numa frequência ultrassônica. Cientista do Instituto Federal de Pesquisas sobre a Floresta, Neve e Paisagem, na Suíça, gravaram os sons e nos explicaram da seguinte forma: quando o fluxo de água enviado das raízes até as folhas é interrompido no tronco, ocorrem vibrações. É um processo totalmente mecânico e não tem nenhum significado. Ou será que tem? Sabemos apenas como esses sons são produzidos, e, comparando com a forma como o homem produz som, concluímos que os processos não são tão diferentes. No nosso caso, o ar passa pela traqueia e faz as cordas vocais vibrarem. Quando penso nos resultados da pesquisa sobre as raízes que estalam, seria totalmente cabível concluir que essas vibrações eram algo mais – gritos de sede, talvez até um alerta às colegas de que a água está acabando.”
Esse mecanismo de regulação natural, é algo presente também em nossos corpos humanos. Porém, muitas vezes, fomos incitados a não escutar as nossas reais necessidades e a utilizar toda essa água, ou energia vital, em direções nada sábias. Muitas vezes, submetemos nosso próprio alimento à um abuso, utilizando recursos em excesso ou escassez, e esquecendo de nos autorregular frequentemente. A familiaridade com os ciclos naturais, permite despertar em nós novamente essa inteligência inata.
Um recurso que temos hoje, é a escolha de nos retirarmos, se não por uma estação, que seja por alguns dias ou semanas.
Em nossa rotina, estamos, frequentemente, inundados por estímulos sensoriais e informações intelectualizadas, e, muitas vezes, perdemos a consciência e a percepção de onde vem a energia que estamos nos alimentando, e mais: pra onde ela está indo?!
Nos submetemos a períodos diários de 'secura vital' que, muitas vezes, se prolongam por dias, meses e até anos ou uma vida, por não tomar a responsabilidade por nossa própria nutrição e a gestão dos recursos que temos a disposição, ou não. Ficamos reféns de um corpo carente, que busca pertencimento e aprovação em vez de saúde e verdadeira paz. Agimos de forma inconsciente de um modo que nos leva a um ciclo de comportamento repetitivo e causam fissuras profundas em nosso tronco. E o pior, muitas vezes nem nos damos conta delas.
Não nos damos o tempo de regenerar camadas mais profundas, tendemos a fazer curativos em machucados superficiais e utilizar fármacos pra aliviar nossa dor. Mas no mais profundo, estamos fracos, quebrados e rachados.
Precisamos de tempo pra regenerar.
Precisamos de tranquilidade pra perceber e entender nossa própria energia autorreguladora. Precisamos parar pra que ela possa fazer seu trabalho novamente.
Com essa inteligência desperta, podemos contribuir positivamente para o nosso entorno e todas as nossas relações.
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